Por Gilberto Tadday
Gostaria de saber o que passa na mente das pessoas que escrevem as regras dos concursos fotográficos. Será que elas pensam que nós, fotógrafos, só sabemos lidar com imagens e não lemos as palavras escritas por eles? Ou será que eles simplesmente nos consideram um grupo de idiotas com uma câmera pendurada no pescoço?
Ontem recebi um email indignado - com toda a razão - do fotógrafo gaúcho Eduardo Tavares. A mensagem trata de um concurso fotográfico organizado por um restaurante de Porto Alegre e mostra a má fé dos organizadores. As regras do tal concurso estabelecem que TODAS as imagens inscritas na competição passam a ser propriedade do restaurante, que pode, inclusive, repassar o direito de uso para terceiros sem nenhuma remuneração ao autor (leia-se você, caro leitor) das imagens. Dá para acreditar? Vale lembrar que normalmente as competições fotográficas exigem que o particpante ceda os direitos de uso da imagem caso ela seja vencedora e somente para uso em divulgação e promoção do concurso. Ou seja, só as imagens que ganharam e não todas as inscritas. E com uso limitado.
O restaurante em questão serve comida portuguesa e, coincidentemente, o tema do concurso é a colonização portuguesa no Rio Grande do Sul. Vamos deixar de lado por um instante a questão do apropriamento das imagens inscritas e vamos ver quais os prêmios que os vencedores irão receber. O primeiro lugar receberá duas passagens aéreas de ida e de volta para o trecho Porto Alegre Lisboa. O segundo lugar irá ganhar uma câmera digital Sony H9 (já está começando a soar castigo ao invés de prêmio, mas não vamos entrar nesta questão agora). E o terceiro felizardo receberá dois cheques-presente de 500 reais válidos onde? Exato, no próprio restaurante. Hum, interessante…
Ok, agora podemos analisar friamente o que isso significa. Traduzindo as letras miúdas das regras, fica claro que o organizador está investindo um valor relativamente baixo nesta promoção em troca de um vasto banco de imagens sobre assustos diretamente relacionados ao negócio dele (restaurante português) e que ele poderá utulizar indefinidamente e da forma que bem entender. Resumindo, numca mais eles precisarão contratar um profissional para fazer fotos para anúncios, cardápio, decoração do restaurante, divulgação, etc. Mesmo se considerarmos que nem todas as fotos terão a qualidade necessária para serem utilizadas posteriormente, ainda assim eles terão fotos suficientes para utilizar durante um bom tempo. E o custo? Você já deve ter somado os valores dos prêmios. A matemática é relativamente simples para concluirmos que é uma barganha (para os organizadores, obviamente).
O pior de tudo é que este não é um episódio isolado de uma empresa pequena do sul do Brasil agindo de má fé. Me lembrou de um caso parecido. Em maio deste ano, a Microsoft lançou um concurso aqui nos EUA chamado “Microsoft Future Pro Photographer Contest”, voltado ao estudantes de fotografia. O primeiro lugar levava 20 mil dólares em cash e mais equipamentos. No entanto, as regras também determinavam que todas as imagens inscritas passariam a ser propriedade deles. O que aconteceu? Os fotógrafos se revoltaram e ameaçar boicotar o concurso. Além disso, a web foi inundada de reclamações contra a Microsoft. Isso fez com que a empresa rapidinho reecrevesse as regras e as letras miúdas. Damage control, como dizem por aqui. Eles passaram a exigir os direitos de uso para divulgação somente dos vencedores, o que é comum. Só assim o concurso foi adiante. A imagem da Microsoft entre os fotógrafos saiu arranhada, mas menos do que se eles não tivessem voltado atrás nas regras.
Não sei se os verdadeiros culpados são empresários que bancam esses concuros ou seus advogados, que escrevem as regras e acham que estão fazendo seu trabalho tirando o máximo de lucro de um mínimo de investimento. Fica claro, pelos termos do concurso, que eles conhecem bem as leis de direito autoral e como contorná-las. Mas eles não parecem muito bons em marketing e não calcularam o prejuízo que vão ter com publicidade negativa gerada pelos fotógrafos.
Sei que é um concurso local e, provavelmente, somente fotógrafos do sul do país iriam participar. Mas acho que é uma questão de princípios. Se ninguém reclamar, vai começar a virar a norma. E daqui a pouco todos os concursos terão este tipo de regras, seja em Porto Alegre, Rio, São Paulo, ou qualquer outro lugar. Não podemos permitir que isso aconteça. Já existe gente demais no mercado querendo se apropriar dos direitos autorais dos fotógrafos em troca de remunerações ridículas.
O email que recebi do Dudu Tavares foi enviado com cópia para outros profissionais do mercado. Alguns já começaram a se manifestar e a sugerir ações em protesto contra o restaurante. Envio de emails para o estabelecimento, ligações telefônicas, não frequentar mais o estabelecimento, avisar os amigos e familiares para não ir mais lá. O que você sugere e o que você pensa sobre o assunto? O restaurante chama-se Calamares. E o site deles, com o contato e as regras do tal concurso, está aqui.
(Gilberto Tadday é fotógrafo e mora em New York)
Um comentário:
É uma palhaçada, né?
Uma folga total... e o pior é que tem gente que nem lê as regras e manda as fotos sem saber o que esta fazendo (normalmente fotografo amador)...
Tem que botar a boca no trambone messssmo.
bjs
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