domingo, dezembro 27, 2020

A Sopa

 (Crônicas de uma Pandemia – Duzentos e Oitenta e Oito Dias)

 

Sobrevivemos, uma retrospectiva.

 

Esse é o resumo do que foi o ano que termina por esses dias. Assim como em todos os anos, mas mais do que nunca, a mudança do ano é apenas uma formalidade de calendário, o dia primeiro de janeiro sendo igual ao trinta e um dezembro. Entraremos 2021 com todo o peso do ano que termina.

 

O ano da peste, versão século XXI.

 

Não pretendo revisitar o ano que termina. Não vou falar de lockdown, distanciamento social, lavagem de mãos, álcool gel, máscaras, contactantes, grupos de risco, UTIs lotadas, tratamento precoce ou vacinas. Não quero falar de politização de assuntos médicos, do uso do nome da ciência para defender medidas sem comprovação. Não vou falar de negacionismo, terraplanismo, crise econômica, desemprego, gripezinha, histeria coletiva ou fim do mundo. Twitter, Facebook ou TikTok. Não, não quero e não vou falar de nada disso.

 

Vou falar do que houve de bom.

 

E, como sabem todos que aqui me leem, esse é um espaço onde falo de mim, do meu umbigo, do que penso e de como vejo o mundo. Portanto, e para que fique bem claro, quando falo de mim não estou negando ou não reconhecendo ou diminuindo de maneira alguma o sofrimento alheio, não estou deixando de ser empático ou solidário. Apenas não é esse o espaço para isso. Aqui sou apenas eu em frente a um espelho imaginário, onde está refletido o que vejo e o que sou. E, como em um espelho, o foco está em mim, apenas.

 

Dois mil e vinte.

 

Fevereiro representou o último mês do meu “ano sabático”, em que havia decidido focar o meu trabalho apenas em meu consultório, em meus pacientes. Sem vínculo empregatício algum, pela primeira vez como profissional liberal puro. Após o verão, de curtas férias e baixo movimento de consultório, Março seria o mês em que as coisas “deslanchariam”.

 

Só que veio a COVID-19.


Os primeiros casos no Sul do Brasil levaram a um pânico generalizado e ao fechamento de tudo, escolas, comércio e restaurantes, entre outros, como todos sabem. Como pneumologista, preparei-me para pior: imaginava o consultório lotado, pacientes e pacientes, mesmo que não fosse atuar diretamente na linha de frente. Só que não foi bem assim.

 

Seguindo as recomendações de ‘fique em casa’, os pacientes desapareceram (os regulares) ou não surgiram (os doentes de COVID). O movimento caiu muito por meses, e se não fosse uma reserva de emergência que havia criado nos últimos poucos anos, teria sido bem difícil. Ao longo do ano, contudo, e principalmente agora nos últimos dois meses de 2020, a tendência inverteu e – para ser honesto – nunca atendi tantos pacientes no consultório como por esses dias.

 

Com isso, poucos pacientes nos primeiros meses de pandemia, e restrições de circulação, e começo a falar do que foi bom nesse maluco ano, passamos muito mais tempo em casa. Nunca almocei tanto em casa quanto nesse último ano, não estivemos tanto tempo juntos com a Marina, em quantidade e qualidade. Foi um ano de convívio familiar muito mais intenso, e foi muito bom neste sentido. Mesmo com o pouco contato pessoal com o restante da família, a tecnologia serviu para nos vermos e conversarmos virtualmente quase todos os dias. Se não preenche, ao menos ameniza a ausência.

 

Maior tempo em casa, menores deslocamentos, tudo isso significou também maior dedicação a outras atividades, como escrever e estudar. Além do cuidado com a saúde e forma física. Perdi 18kg no último ano, a maior parte de março para cá, com pequenas alterações na dieta (diminuindo bem pouco a quantidade) e com muita atividade física. Além da academia, de segunda a sexta-feira, que mantive mesmo quando minhas atividades profissionais reduziram em muito o meu tempo disponível, esse foi um ano de pedalar muito mais que o no ano anterior. Resultado disso: menor peso, menor percentual de gordura corporal, mais disposição, melhora de autoestima. Tudo isso em meio à pandemia.

 

Em julho, após reencontrar uma ex-aluna em uma reunião virtual, e depois de dois anos fora da vida acadêmica, senti vontade de retomá-la. O timing foi perfeito, e em agosto retornei à Universidade, e dessa vez – apesar de não ser (ainda) em Porto Alegre – fica apenas a trinta minutos de casa...

 

Acima de tudo, o meu ano da peste de dois mil e vinte foi um ano de desaceleração, de ter mais tempo de olhar a vida com mais calma, e de estar mais próximo – mesmo que virtualmente em alguns casos – daqueles que são importantes.

 

A expectativa de que a vida, o mundo com um todo, retome um ritmo mais normal, continua. Enquanto isso, vamos vivendo um dia após o outro, fazendo o que podemos e ajudando quem podemos. Cada um tentando (deveria, ao menos) colaborar do jeito que dá.

 

E assim seguimos.

 

Bom 2021 para todos nós.

 

E que o próximo ano seja um ano de reencontros.

 

Até.

 

segunda-feira, dezembro 21, 2020

A Sopa

(Crônicas de uma Pandemia – Duzentos e Oitenta e Dois Dias) 

Árvore genealógica, uma crônica sem muito sentido.

 

Estávamos, esses dias, conversando – a Jacque, a Marina e eu – à mesa, após o jantar, amenidades. Assuntos diversos, desde séries do streaming até música e outros. Começamos, em determinado momento, a falar de família.

 

A Marina perguntou, então, a letra inicial dos nomes de todos da família, incluindo aí os dois lados, da Jacque e meu, incluindo familiares distantes. Começamos a listar, então, por ordem alfabética, todos os que lembrávamos, pais, filhos, tios, tias, irmãos, irmãs, primos, primas, de primeiro, segundo e até terceiro grau, sobrinhos, agregados ou não, próximos e mesmo os muito distantes. Até que surgiu um nome de um familiar que já havia morrido.

 

A dúvida (inútil, sabemos, mas era momento de conversas bobas) surgiu: incluímos ou não na lista os familiares que já morreram. Nenhuma forma de desrespeito ou falta de consideração, obviamente. Apenas um detalhe prático para nossa lista de parentes...

 

Após rápida deliberação, decidimos que familiares próximos, pais – por exemplo – continuariam na lista mesmo que já mortos. Eu continuaria na lista, de qualquer maneira, dessa forma. Eu estava garantido nas futuras atualizações da lista (como se fôssemos atualizá-la em algum momento no futuro). Fomos adiante.

 

A lista, claro, ficou grande.

 

Nova deliberação.

 

Familiares muito distantes ou ausentes mereceriam fazer parte da lista?

 

Depende, decidimos.

 

Se não houver encontro presencial por um período de dois anos, ou seja, se não houver qualquer tipo de reunião nesse período, será cortado da lista. Simples assim. Dois anos inteiros sem encontrar um familiar resulta em exclusão da lista. Paciência. Como se recomenda com roupas do armário, que devemos descartar as que ficam sem uso por um longo período. Familiares, caso não estejamos juntos, da mesma forma...

 

Claro que, em tempos de pandemia e distanciamento social, esses limites foram alongados, assim como milhas aéreas de um programa de fidelidade. 

Ninguém será excluído esse final de ano...   

 

Até.

 

PS – Esse é um texto de ficção. Qualquer semelhança com fatos ou pessoas reais é mera coincidência...

sábado, dezembro 19, 2020

Sábado (e Paris numa outra vida...)

 

    Paris, France

    Final do dia. Setembro de 2018.

    Bom sábado a todos.

    Até.
                      

segunda-feira, dezembro 14, 2020

A Sopa

(Crônicas de uma Pandemia – Duzentos e Setenta e Cinco Dias)

 

Um texto não muito bem humorado.

 

O ano civil vai para sua última quinzena.

 

De agora até o início de 2021 serão pouco mais de duas semanas, mas parece que dois mil e vinte não terminará assim tão facilmente. Parece querer se arrastar por mais tempo, manter-nos presos a ele o quanto der, tentando de todo jeito se eternizar.

 

Falo da pandemia, claro.

 

Como havia falado, minha expectativa (esperança, agora sei) de que ao terminar dois mil e vinte tivéssemos superado essa fase maluca de distanciamento, de abraços ausentes e proximidades – quando ocorriam – culpadas, provou ser nada mais que isso, esperança. Continuamos sitiados pelo vírus e pelo medo, vítimas de governantes ou em descompasso com a realidade, negando o óbvio, ou pequenos tiranos tentando impor suas medidas irracionais baseadas “em ciência”. Seguimos ao sabor das ondas, nos cuidando do jeito que dá.

 

Quando se estimula que as pessoas denunciem seus pares por se reunirem, quando “premiam” quem se avança sobre a privacidade dos outros, é sinal de que há algo muito errado. O mais impressionante é que ninguém se espanta ou revolta com isso. A liberdade individual (que pressupõe responsabilidade) é cada vez mais um conceito etéreo, fluido, quando – obviamente - não deveria ser.

 

Eu só saio de casa de máscara desde o início da pandemia.

 

Eu trabalho de máscara e face shield.  

 

Eu tomo todo o cuidado possível, para não me contaminar e não contaminar os outros. Mas não estou histérico, nem fico contando isso como vantagem em redes sociais.

 

Estamos em uma prisão. Pelo vírus, pelo politicamente correto, pelo pensamento único que não admite contraditório. Estamos presos em uma narrativa escrita por quem quer nos dominar pelo medo. Uma hora isto tem que acabar.

 

E, por estar nessa prisão maluca, o jeito é viver um dia de cada vez.

 

Até.

sábado, dezembro 12, 2020

Sábado (e um lugar)

 

     Halifax, Nova Scotia, Canada

     Outubro/2019

     Bom sábado a todos.

     Até


terça-feira, dezembro 08, 2020

Crônicas de uma Pandemia – Duzentos e Sessenta e Nove Dias

 E em meio à pandemia...

Uma noite dessas, não muito tarde, enquanto estávamos tranquilos em casa assistindo televisão, nossa atenção foi desviada por uma gritaria, uma altercação, pedidos quase histéricos de desculpas seguidos por gritos de ‘Eu te amo’, além de ‘não me toque’, e outros com o mesmo sentido. Um barraco, como dizem.

 

O meu vizinho que toca bateria e fuma maconha, evidentemente.

 

Tudo muito alto, todos no edifício certamente ouvindo. Pelo que se escutava, parecia uma briga de casal, aparentemente chegando às raias da violência física, pela progressão dos gritos. Marina com fones de ouvido para não precisar ouvir, eu tinha que tomar uma decisão.

 

Intervir ou não.

 

Como já falei anteriormente em outras situações, o que as pessoas fazem com suas vidas privadas não diz respeito a ninguém mais, exceto quando interferem com a vida em sociedade. Ou seja, quando não coloca o bem estar e a segurança de mais ninguém em risco. E os seus vizinhos estão aí incluídos, naturalmente. 

 

Volto à noite em questão.

 

Liguei para o síndico, que atendeu e fiz apenas uma pergunta: deveria chamar a polícia ou não? Debatemos rapidamente o assunto e (por sugestão dele, que estava mais próximo do evento) e decidimos esperar e observar atentos para um possível escalada violenta nos acontecimentos. Momentos tensos.

 

Tudo acalmou, contudo.

 

Mais tarde, descobrimos o que havia acontecido (ele – o síndico - descobriu, e me contou): separado/divorciado ele (o baterista maconheiro), mas com uma nova namorada, havia sido flagrado com outra pela namorada que chegara em sua casa de surpresa... E as duas ainda se conheciam! Pois é...

 

Outra noite, uns dias após, somos acordados em meio a madrugada por gritos dele dizendo ‘eu te amo’ e ‘agora estás me agredindo’, mas de curtíssima duração, pois logo o silêncio da noite voltou até que os sabiás começassem a cantar e liquidar definitivamente com minha noite de sono...

 

E a corda vai esticando...

 

Até.

domingo, dezembro 06, 2020

A Sopa

 (Crônicas de uma Pandemia – Duzentos e Sessenta e Sete Dias)

 

Uma história do passado.

 

Há muitos anos, quando ainda tínhamos a casa na praia, no Imbé, litoral norte do Rio Grande do Sul, no tempo das casas sem muros e grades, e próximas umas das outras, e quando ainda era tradição a reunião de grandes famílias nos finais de semana, havia – bem ao lado da nossa casa – justamente vizinhos com grande família e que tinham por hábito reunir-se e confraternizar muitas vezes até altas horas da noite. Não necessariamente grandes festas e grandes ruídos, mas – na maior parte das vezes – apenas conversando na área em frente e na lateral da casa.

 

Bem ao lado da nossa, bem onde ficavam os quartos em que dormíamos, o que – evidentemente – atrapalhava o nosso sono quando acontecia. E, claro, irritava.

 

Nunca reclamamos, contudo.

 

Até que uma vez em que isso aconteceu, provavelmente uma festa de aniversário mais animada e que invadiu a madrugada e eu – ao chegar sábado de manhã cedo para passar o final de semana com meus pais e ficar sabendo do ocorrido – decidi que era hora de um retorno: ainda antes das nove da manhã, estacionei meu carro em frente à nossa casa e passei a tocar música, a todo volume possível. AC/DC, Highway to Hell

 

Não demorou uma música inteira para alguém na casa ao lado abrir a porta, com cara de muito sono, e – educadamente – perguntar se eu poderia diminuir o volume do som porque queriam dormir. Claro que eu podia. Prontamente baixei o volume, ou mesmo desliguei o som, não lembro mais.

 

Você, caro leitor, pode estar se perguntando por que eu atendi ao pedido se havia muito tempo éramos incomodados pelos ruídos que vinham da casa ao lado em muitas noites de conversas e risadas e festas? Por uma simples razão. Porque nunca havíamos reclamado, nunca havíamos manifestado nosso incômodo com o barulho. Se não manifestamos nossa inconformidade, como saberiam que estávamos incomodados?

 

Voltemos ao presente.

 

Tenho um vizinho maconheiro que toca bateria.

 

Sério.

 

Problema dele, não me diz respeito. Não me incomoda, desde que não interfira na paz da minha casa. Ele faz aulas de bateria algumas vezes à noite, e vai ao limite do horário de silêncio, mas – exceto uma vez – não passa das 22h. Está no direito dele. É o mais adequado, tocar bateria num apartamento sem isolamento acústico? Não, com certeza. Mas se ele não invade o horário de silêncio, está no seu direito, por mais que ninguém goste. 

 

O mesmo com a maconha, cuja fumaça nos atinge algumas vezes se deixamos janelas abertas. É ruim? Eu acho, mas ele está na casa dele, e o que ele faz não me diz respeito, é livre para fazer o que bem entender, desde que não interfira com a minha liberdade e paz. Desde que não avance sobre os meus direitos. Porque se isso acontecer, bom, aí certamente vou reclamar, e muito.

 

Simples assim.

 

Até.

sábado, dezembro 05, 2020

Sábado (e um café)

                         Um café no final da tarde... e uma caminhada pelo bairro...

                          Até.

 

quarta-feira, dezembro 02, 2020

Crônicas de uma Pandemia – Duzentos e Sessenta e Três Dias

Progressistas. 

Não há nenhum valor mais importante que a liberdade individual.

 

Não há nada mais progressista do que buscar, respeitar e valorizar a liberdade individual em todos os momentos. O respeito ao indivíduo, em todas as dimensões possíveis, e - por conseguinte - a todos os indivíduos sem restrições ou condicionantes, é o ideal de uma sociedade.

 

Respeitar a todos individualmente, independente de qualquer condicionante, é o melhor que alguém que se diz progressista deveria fazer e pregar como conduta individual. A forma como cada um escolhe viver não diz respeito a ninguém mais, desde que esse respeito seja mútuo. Se você não respeita a minha individualidade, você não pode exigir que eu respeite a sua. Viva como achar melhor, desde que não interfira com o outro. O velho papo: a liberdade de um acaba quando começa a do outro. Respeitar os limites do outro é (ou deveria ser) a base da civilização. 

 

Aliás, tentar impor a sua verdade aos outros, (tentar) forçá-los a viver o seu modo de vida, é o maior dos desrespeitos. E falo de política, religião, futebol, ou qualquer outra dimensão que possamos pensar.

 

A defesa da liberdade individual é o máximo do progressismo.

 

Coletivismos, seja quais forem, independente a bandeira que levantem, são contra a liberdade individual, e – portanto – uma afronta à ideia de liberdade. A esquerda, que se apropriou de bandeiras consideradas, chamadas progressistas, tem como característica a defesa do coletivo em detrimento do individual, em detrimento da liberdade.

 

A esquerda não é progressista. Nunca foi.

 

É sectária, agressiva e rancorosa.

 

Vamos dar nome aos bois.

 

Até.