segunda-feira, maio 18, 2020

Crônicas de uma Pandemia – Sexagésimo Quarto Dia


Saudades.

Há algumas semanas, já durante o período de distanciamento social (que parece estar por aqui há muito tempo), entrei em um seminário via Zoom do grupo de Cirurgia Bariátrica do qual faço parte há cerca de quatorze anos. Quem apresentava a aula era a Jacque, que estava sentada bem à minha frente, em nossa sala. Foi engraçado: eu a ouvia falando em minha frente e, com pequeno delay, ouvia no fone de ouvido.  

Mas não era disso o que eu queria falar.

É que ainda antes de eu entrar na reunião, olhando por cima do ombro da Jacque os participantes da reunião, entre eles cirurgiões, endocrinologista, gastroenterologista e residentes de cirurgia, um rosto me chamou a atenção, por conhecido. Demorou poucos instantes e me dei conta: era uma ex-aluna minha, de quando fui professor na Universidade de Santa Cruz do Sul.

Corta para hoje.

Fui até o hospital pela manhã para uma rápida reunião, e – já quando saía – de máscara, pelo corredor mais ou menos vazio, passou por mim – distância segura – também de máscara, um colega que me acenou – de longe, só para deixar claro – e me saudou como ‘Professor’. Outro ex-aluno da UNISC. Como vários que encontro pelos hospitais em que trabalho (alguns até ex-residentes, vejam só, de pneumologia). Fiquei feliz com o encontro, e - confesso - foi a primeira vez em quase dois anos que tive saudades de ser professor.

Como sabem, fui Professor de Pneumologia de Universidade de Santa Cruz do Sul durante quase dez anos, até o final de junho de 2018, quando me exonerei/pedi demissão por uma série de fatores, entre os quais cansaço da estrada (eram 300km toda terça-feira), as próprias condições da estrada, a crescente dificuldade de conciliar a Universidade com o tempo que me era exigido no meu trabalho de Especialista Médico na indústria farmacêutica (da qual eu sairia oito meses depois, mas isso é outra história, já contada por aqui). Eu estava cansado, naquele momento. Os finais e inícios de ano eram mais estressantes por conta de relatórios e projetos cada vez mais burocráticos, e que mudavam toda hora.

Talvez não mudassem, apenas eu que estivesse com tolerância baixa.

De qualquer forma, sempre gostei muito mesmo de dar aulas, do convívio com os alunos, que eu via como colegas mais novos, com menos experiência que eu, e que obviamente com o passar do tempo a diferença de idade foi ficando cada vez maior. Até hoje sou “amigo” de muitos em redes sociais, acompanho suas vidas e torço pelo seu sucesso, como um irmão mais velho.

Dizia eu, então, que tive saudades de ser professor, de dar aulas.

Pode ser que esse sentimento, essa vontade de estar com as pessoas, seja pelo fato de estarmos nessa fase de distanciamento social, de reclusão, podemos dizer. Estaria eu pensando em voltar a ser professor por carência?

Acho que não.

Eu gosto de pessoas, de conviver com elas.

Mas, por outro lado, estou gostando muito mais da fase que vivo no último ano e pouco, de independência, de mente tranquila, de paz interior.

E isso vale mais que qualquer outra coisa.

Até.

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