Ainda o meu pai.
Sempre me perguntei como eu reagiria frente ao final da vida de meus pais. Como seriam os dias seguintes, como tocaria a vida na ausência das minhas principais referências, daqueles responsáveis por eu ser quem eu sou e por estar onde estou. Como seria a vida sem meu pai e/ou minha mãe. Saberia eu viver sem suas orientações e conselhos?
Como o passar dos anos, à medida que eu ganhava experiência de vida e estrada, digamos assim, mais “tranquilo” eu ficava porque aparentemente eu saberia cuidar de mim, e saberia cuidar de quem dependesse de mim. A vida seguiria, como sempre segue, afinal de contas.
Há vinte e seis anos (que serão completados na próxima quarta-feira, 31 de agosto) que já caminho com minhas próprias pernas ao lado da Jacque e há quatorze como responsáveis pela Marina, e não faz muito que parei de – vez que outra – me espantar com o fato de estar conseguindo “viver por conta própria”, sem auxilio dos meus pais. Parece bobo, e certamente é, um cara de cinquenta anos ainda se espantando por estar conseguindo viver por conta própria, sem precisar da ajuda dos pais.
Não importa.
Dizia que aprendi a viver fora da proteção direta dos meus pais, mas minha óbvia ligação emocional com eles permaneceu e até se reforçou (como se fosse possível) nos últimos anos, quando passei de alguém que era cuidado para alguém que cuidava, ou, ao menos, ajuda a cuidar. O cuidado como mais uma forma de demonstrar amor. Um amor incondicional.
As duas últimas semanas de julho passado, desde a internação do pai até o dia seguinte, do funeral, foram de sentimentos intensos, por vezes conflitantes. De querer que ele melhorasse, claro, mas da triste e resignada consciência de que, se ele saísse do hospital, sairia com uma qualidade de vida ainda pior do que já estava antes de internar, e que ele acabaria sofrendo ainda mais. Dos últimos dias da internação, quando já sedado e com uma febre que não cedia, quando tudo o que eu desejava é que ele parasse de sofrer, que ele descansasse. Entre o sentimento egoísta de querer mantê-lo a qualquer custo e a triste aceitação de que o fim estava chegando e o que ficaria seriam as lembranças, histórias e ensinamentos.
Há alguns anos, em um Natal, dei de presente a ele um boneco do Superman, dizendo que o presente simbolizava o que ele representava para mim. Tenho isso tatuado em minha alma.
E agora também no meu antebraço.
Até.