Memória.
A primeira música que lembro de ter ouvido do Piazzolla, ainda no final dos anos 80, foi Years of Solitude (Años de Soledad, em espanhol), gravada em Milão em 1974 por ele e pelo saxofonista Gerry Mullingan no disco Summit. Até hoje, essa música, que combina a melancolia portenha do tango do Piazzolla com a emotividade do jazz de Mullingan, está entre minhas preferidas.
Ouvi muito ela naquele final de anos oitenta, que coincidiu com o final do ensino médio (segundo grau, na época). Lembro que tinha uma gravação em fita cassete, e que se perdeu ao longo do tempo. “Perdi” o contato com essa música em especial naquele período de início de faculdade de medicina, com novos grupos de convívio com interesses e gostos diferentes. Quase a esqueci por alguns anos, período em que ficou adormecida em meu subconsciente, enquanto eu ouvia outras coisas.
Quando fui retomá-la, no sentido de voltar a ouvir, percebi que não possuía mais a gravação em fita cassete e logo depois nem o rádio toca-fitas, que se perderam na passagem do tempo, no avanço tecnológico e em um carro roubado anos mais tarde. Busquei, então, a gravação em um CD (o vinil havia se tornado obsoleto naquele momento). Em Buenos Aires, comprei dois diferentes com gravações que não aquela que eu procurava. Levou um tempo, mas encontrei, enfim, o ‘Summit’, que tenho até hoje, apesar de não ter mais onde tocar CD em casa enquanto, em um daquelas ironias do mundo, esse pândego, tenho como tocar discos de vinil.
Evidentemente que Bears of Solitude não era a única música dele de que eu era fã, mas foi a primeira e provavelmente a mais marcante. Houve um momento, acho, que ela esteve “meio em moda” no Brasil, não sei se tocou em alguma trilha de filme ou novela, mas ficou bem conhecida. Nessa época, eu estava procurando o ‘Summit’ para comprar e lembro de ir a uma loja atrás do CD (ia dizer que era em uma das lojas da Galeria Chaves, Centro de Porto Alegre, mas eu as frequentava quando só existiam disco em vinil).
Enquanto procurava o CD na seção de tangos, um atendente veio falar comigo, oferecer auxílio. Disse que procurava pelos trabalhos do Piazzolla, ao que ele me olhou, me julgou (eu percebi, tenho certeza, não sou paranoico) e perguntou se eu procurava por alguma música em especial (eu sabia que ele estava me considerando um ouvinte de uma única música). Sim, pensei, eu estou atrás DESSA música que está imaginando, mas, não, NÃO sou ouvinte de uma só música dele (e se fosse, qual seria o problema?).
Adios Nonino, Libertango, Balada para un Loco, Oblivion...
Naquele dia, não encontrei o ‘Summit’, que compraria em algum momento no futuro, pois ainda não havia surgido o streaming, mas comprei outros dois ou três, para provar que eu não era fã de apenas uma música. Claro que o vendedor não estava nem aí para isso, queria apenas vender (o que conseguiu). Eu é que me preocupava mais do que deveria com o que os outros pensavam. Daquela vez, pelo menos, minha discoteca ganhou com isso...
Até.