domingo, junho 20, 2021

A Sopa

 (Crônicas de uma Pandemia, Ano Dois, Nonagésimo Quinto Dia)

 

Sobre as comparações.

 

Se existe, na vida, uma certeza qualquer além da morte, é que sempre haverá alguém melhor e alguém pior que a gente. Simples assim, e é a forma que lidamos com isso que vai determinar muito de como vamos encarar a vida.

 

Como em tudo, há várias interpretações para isso.

 

Podemos focar naqueles que estão acima de nós, em termos financeiros, profissionais, de fama ou sucesso. O colega, o conhecido ou o amigo com maior salário, melhor carro ou casa, mais bens materiais, maior status social, vida aparentemente perfeita. A comparação pode servir de estímulo para que sigamos em busca de mais, de crescer, de obter mais. Aí, tudo bem. Mas pode ser que – ao olhar a grama aparentemente mais verde do vizinho – nos torne rancorosos, amargos, com a sensação de sermos injustiçados, a velha história do “por que não eu?”.

 

É uma forma de ver ruim, claro, e que faz mal a quem sente isso. A inveja é uma merda, diz o ditado popular. A energia negativa nos empurra para baixo. Nos torna, como já falei, amargos e negativos.

 

Porque ao mesmo tempo em sabemos que existem muitos que estão em “melhor” (e coloco entre aspas porque o conceito de melhor é bem individual, depende de cada um e suas prioridades) situação que nós, existem muitos, mas muitos mesmo, que estão em situação mais difícil que nós. Independente do que estamos analisando, saúde, dinheiro, ou qualquer outro critério, sempre haverá alguém cujos problemas são maiores que os nossos. Só isso já deveria ser motivo para iniciarmos todos os dias com energia renovada por termos o que temos, por estarmos vivos e em condições de seguir em frente.

 

Sob certa forma, é o que tenho tentado fazer nos últimos tempos, e que se acentuou durante a pandemia: se há um problema que inicialmente parece muito grande, procuro lembrar que poderia ser bem pior, ou não ter solução, e que esses – os sem solução – são raros na vida. Respiro fundo, olho em volta, e tento seguir em frente, porque – no fundo – não são tão horríveis assim.

 

É uma forma, também, de lidar com a ansiedade.

 

Saber que existem situações que não dependem de mim, que vão acontecer independente da minha vontade e que não serão alteradas quaisquer que sejam meus esforços, dá uma certa tranquilidade e a possibilidade de focar naquelas situações e problemas que – sim – dependem de mim. Aprender a diferenciá-las, isso sim, um trabalho diário.

 

Outra forma de lidar com a vida e as comparações é – e isso é ainda mais difícil – procurar não comparar. Somos todos diferentes, começamos de locais diferentes e temos necessidades e objetivos diferentes. Lembrar que o que é importante para mim provavelmente não é o mesmo que é importante para outros facilita esse exercício. Todos temos dificuldades, problemas e desafios na vida. Assim como, por mais parecidos que sejam, os caminhos que percorremos são diferentes. Comparar diferentes é injusto, conosco e com os outros.

 

Lembrar disso todos os dias é mais um desafio.

 

Até

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