domingo, abril 24, 2005

A Sopa 04/40

A partir de hoje, vou cuidar muito bem o que digo e/ou escrevo aqui no blog. Imaginem se um dia eu saio papa de um conclave: vai ser bem desagradável ficar vendo a imprensa revirar o meu passado para saber o que disse ou escrevi muitos anos antes.

Pior, o que vão dizer quando descobrirem que fiz parte do M.O.R.T.E. (Movimento Organizado Revolucionário Terrorista e Exterminador) e – mais – cheguei ao cargo máximo de sua hierarquia – Mortandade-Mor – aos doze anos de idade?! E que fui um dos fundadores do menor país do mundo, com cerca de mil metros quadrados, no litoral norte do Rio Grande do Sul, que voltou a ser parte do Brasil, de forma pacífica, pouco tempo depois de sua fundação, porque tínhamos que ir à praia e nos preocupar com assuntos mais importantes. Mulheres, evidentemente…

Bom, mas eu tinha prometido a mim mesmo não falar mais sobre o Papa, mas não dá para resistir. Além disso, todo mundo tem dado palpite sobre se ele é conservador, se é contra isso ou aquilo. Como eu era muito novo na época dos dois últimos conclaves, que elegeram, respectivamente, João Paulo I e II, não tenho como lembrar se ficaram discutindo, à época, se o João Paulo II era a melhor escolha, se seria um bom papa, etc. Acho que não.

Agora é diferente, o mundo mudou, vivemos a era da informação, o que acontece em Roma é visto no Brasil em tempo real, etc. E tudo e todos parecem que ficaram muito íntimos. É o Ratzinger prá cá, Ratz prá lá, como se ele fosse um parceiro de mesa de bar nosso. Desde quando se discute se um papa escolhido é o melhor? Desde quando se torce para que um papa seja de um ou outro país? Alguém escreveu e eu endosso: tava parecendo torcida de jogo de futebol. Ou briga de partidos políticos por seus candidatos.

Não vou entrar neste campo, da política, ao menos hoje. Prometo ficar restrito à religião. Até porque há muita polêmica que pode ser criada em torno do assunto. A começar pelos dogmas e a discussão em torno deles. Que, adianto, acho uma discussão sem sentido, e para isso me aproprio do que escreveu Umberto Eco em livro já citado neste blog ‘Em que crêem os que não crêem’, escrito em parceria com o Cardeal Carlo Maria Martini, ex-cardeal de Milão e um dos papáveis do último conclave. Discutindo sobre alguns dogmas, Umberto Eco escreveu:

“Em princípio, considero que ninguém tem o direito de julgar as obrigações que as várias confissões impõem a seus fiéis. Não tenho nada a objetar contra o fato de que a religião muçulmana proíba o consumo de substâncias alcoólicas; se não estou de acordo, não me torno muçulmano. Não vejo porque os leigos devem se escandalizar porque a Igreja Católica condena o divórcio: se alguém quer ser católico, que não se divorcie; se quer divorciar-se que se faça protestante; e reaja apenas se a Igreja quiser impedir você, que não é católico, se divorcie. Confesso que me sinto até irritado diante dos homossexuais que querem ser reconhecidos pela Igreja, ou dos padres que querem se casar. Quando eu entro em uma mesquita, eu tiro os sapatos, e em Jerusalém aceito que em alguns edifícios, aos sábados, os elevadores andem sozinhos, parando automaticamente em cada andar. Se quero manter os sapatos ou comandar o elevador a meu bel-prazer, vou para outros lugares. Há algumas recepções (laicíssimas) em que se exige o smoking e cabe a mim decidir se quero me submeter a um hábito que me irrita porque tenho alguma razão imperiosa para participar de tal evento ou, se quiser afirmar minha liberdade, ficar em casa…”


Pois é, falou o que eu vinha pensando há algum tempo – talvez desde que li o livro a primeira vez, há alguns anos. Não acho que a Igreja deva se modenizar, nem flexibilizar seus dogmas em virtude de uma dita evolução dos tempos. Nem acho que a Igreja deva se adaptar às pessoas, mas o contrário. As pessoas devem ser moldar ao que diz a Igreja. Ou não freqüentem. Ninguém obriga ninguém a seguir determinada confissão, mas uma vez que decide ser católico, ou protestante, ou muçulmano, deve se adaptar a ela. Ou ficar à parte, laico.

Como o casamento de homossexuais: sou a favor. Casamento como contrato social, com mesmos direitos e deveres perante à justiça, etc. Mas não faz sentido querer casamento religioso, conforme as leis da igreja: até porque essas leis não prevêem isso.

Complicado, polêmico. Tudo isso, admito. Eu, por exemplo, por questões pessoais, freqüento muito pouco a Igreja e, quando lá, não comungo. Porque não concordo com tudo o que é determinado, e tenho dúvidas e questões que, enquanto não forem resolvidas, através de estudo e quem sabe fé, não me permitem participar ativamente dos ritos da igreja. Acima de tudo, cada um tem sua fé e – seja qual for – deve ser respeitada.

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Fórmulas

(Nelson Lehmann)

Fazer ciência é tentar esclarecer um fenômeno por uma fórmula, a mais sintética (e elegante, dizem) possível. A ‘E = mc2’ de Einstein exemplifica. Direi que nas chamadas Ciências Humanas, a distinção entre Liberalismo e Socialismo (uma polaridade histórica constante ) seria redutível a fórmula:

Socialismo = a cada um segundo suas necessidades
Liberalismo= a cada um segundo seus méritos

Isto aceito, surge a questão de definir MÉRITO e NECESSIDADE. Ora, mérito se define como uma mais ou menos universal valoração comparativa entre feitos e competências. Quem mais merece será quem mais corresponder a expectativas dos demais. Quem supostamente mais contribuir para o bem comum. Este merece mais aplausos, respeito, consideração, prestigio, autoridade, prêmios, remuneração, etc.

Assim se estabelece o preço, o valor, a admiração, a emulação. Do futebol à musica popular, do profissional ao artista, do produto ao serviço. Sempre existiu o melhor, o pior e a graduação intermediária. As Olimpíadas e o Oscar, as notas escolares e o preço dos ingressos, tudo isso expressa o juízo de mérito.

Já a questão das NECESSIDADES introduz uma imprecisão insolúvel. Necessidades humanas se distingüem entre mais/menos urgentes, mais/menos Importantes. Comer, beber, dormir, abrigar-se, são inadiáveis, urgentes. Segurança, afeto, informação, etc, são importantes, mas prescindiveis.

Numa tribo da idade da pedra, necessidades básicas serão providas. Por mais miseráveis que sejam não terão termo de comparação e se julgarão satisfeitos. Mas no dia em que um dos participantes ganhar uma espingarda, aquilo vai tornar-se algo desejável para os demais. Logo, uma Necessidade reclamada por todos. A necessidade é relativa ao que outros já alcançaram. A necessidade de um negro americano não é a mesma que a de um negro africano. As necessidades de um pobre sueco não serão as mesmas de um miserável nordestino. Seus termos de comparação serão outros.

Portanto, diferentemente de Mérito, Necessidades são relativas. Relativas ao obtido por outrem, independentemente de mérito. Ou de sorte. Prezar e retribuir ao mérito é espontâneo, natural. É o que chamamos avaliação, comparação, preferência, escolha, ou MERCADO.

Considerar necessidades é algo relativo, circunstancial, artificial, ou POLÍTICA democrática…

Um comentário:

Anônimo disse...

Eu nao me importo de ele ser conservador, ate porque eu nao vou a igreja, nao comungo, e so rezo em casa mesmo.
O que eu acho e que ele ja esta ficando bem idoso, e daqui a um tempinho deveremos ter outra eleicao. Mas quem sou eu pra falar qualquer coisa! Seu texto falou tudo, Marcelo. Beijo!