terça-feira, setembro 04, 2007

Eutanásia (Túnel do Tempo)

Um texto de dois anos atrás, para pensar.

Religião é um assunto de foro íntimo de cada um.

Por isso respeito todas as diferentes religiões e credos. Cada um acredita naquilo que mais lhe conforta, que mais traz paz interior. Não acho que uma seja melhor que a outra e que nenhum deus tenha preferência sobre qualquer outro. Aliás, é querer obrigar os outros a seguir as mesmas crenças o que torna a religião motivo de tanta intolerância e sangue derramado.

Apesar de respeitar todos os credos, como falei, para algumas coisas eu não tenho paciência nenhuma. Mais, não só não tenho paciência como – confesso – fico intolerante.

Acho religião importante, sim, mas num nível pessoal. É, religião é um assunto pessoal, individual. Mesmo que milhares de pessoas sejam da mesma religião, compartilhem experiências, frequentem igrejas, ou templos, juntas, ainda assim é assunto que diz respeito a cada um. Por isso que religião não pode jamais se misturar com o estado. Porque não dá certo, simples. Há um movimento nos Estados Unidos tentando isso, inserir religião nas coisas do estado, e isso é um erro gigantesco. Mas, deixa para lá, não é disso que quero falar.

Como acredito que religião serve, além de meio de se alcançar conforto e paz espiritual, também, de certa forma, como guia de condutas morais, também não aceito que se “intrometa” em um outro assunto que não diz respeito a ela: a vida, no sentido biológico, das pessoas. E vocês estão começando a entender onde quero chegar.

Como no caso não tão recente assim (mas ainda desse ano) da americana Terri Schiavo, que vivia em estado vegetativo irrecuperável há anos e que o marido queria a suspensão do suporte de vida, e choveram protestos de grupos dito em favor da vida protestando contra. Falei sobre isso na época, acho que tinha de suspender sim, se fosse comigo eu gostaria que fizessem o mesmo.

Agora, no Brasil, caso não exatamente igual está acontecendo, e vem aí mais uma batalha judicial (certamente não tão longa quanto à americana) envolvendo o assunto, que chamam de eutanásia: em São Paulo, um pai vai recorrer à justiça para suspenderem o suporte de vida ao seu filho, João, de 4 anos, vítima de uma síndrome degenerativa incurável. Reproduzo abaixo, trecho da notícia que saiu no Terra:

"Segundo o jornal Comércio da Franca, que revelou o caso à imprensa, ele é alimentado por meio de uma sonda ligada diretamente a seu estômago e respira com ajuda de aparelhos. João ainda registra atividades cerebrais, mas não pode mais enxergar, não fala e não tem mais os movimentos do pescoço, braços e pernas".

Precisa dizer mais alguma coisa? Só para reforçar, então: é alimentado por meio de uma sonda ligada diretamente a seu estômago e respira com ajuda de aparelhos… ainda registra atividades cerebrais, mas não pode mais enxergar, não fala e não tem mais os movimentos do pescoço, braços e pernas.

Bom, a mãe é contra. O que ela diz?

"Esse garoto é a minha vida. (...) Eu tenho fé, acredito na força de Deus e sei que Ele vai salvar meu filho".

Pois é. Complicada a situação, admito. Ambos, o pai e a mãe, amam o seu filho, sem dúvida, mas não posso deixar de me posicionar do lado do pai. A pobre criança está sendo mantida viva com ajuda de aparelhos, não tem vida de relação. Em termos práticos, está morta. A mãe não aceita, é compreensível e é parte do luto a negação. Amar, contudo, às vezes é deixar a vida seguir seu curso.

O que não consigo aceitar bem é que o caso virou uma polêmica, e aqueles “a favor da vida em qualquer situação” (SIC) se utilizem do nome do seu deus para condenarem o pai dessa pobre criança que também a ama e só quer que ela não sofra. Dizem que só deus pode tirar a vida de alguém. Seguindo este raciocínio, só deus poderia manter a vida, e suporte artificial de vida deveria ser “pecado”. Não faz sentido?


(publicado em 04/09/2005)

Até.

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