Reproduzo aqui a Carta da Sociedade Paulista de Pneumologia e Tisiologia em resposta às afirmações do Presidente em relação aos médicos:
A Sociedade Paulista de Pneumologia e Tisiologia (SPPT) sente-se atingida frontalmente pelas declarações proferidas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 25 de março, durante cerimônia de entrega de 650 ambulâncias do Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU) em Tatuí, interior de São Paulo.
Em seu discurso, queixou-se da falta de recursos para a saúde, da desigualdade ao seu acesso, do excesso de tecnologia que afastam o médico do paciente. Relatou a sua experiência atual, como presidente da República, com acesso a hospitais de excelência através do seu plano de saúde, quando a cada check-up é seguido por um séqüito de trinta médicos, diferentemente do que ocorria quando metalúrgico. Afirmou que a falta de assistência médica no interior seria de responsabilidade dos médicos que cobrariam caro para atuar nestas regiões e a solução proposta foi a de "formar uma geração de médicos mais de esquerda", dispostos a trabalhar por menos. Congratulou os médicos formados em Cuba que se dispõe a atuar nas áreas mais carentes, afirmando, inclusive, que "'e muito fácil ser médico na Avenida Paulista, ou na Avenida Copacabana".
Em defesa dos pneumologistas paulistas e dos demais médicos brasileiros, a SPPT avaliza integralmente a resposta da Associação Médica Brasileira (AMB), pois, de fato, o que nos falta, há anos, é uma política de saúde que, entre outras responsabilidades, seja capaz de levar um sistema de saúde adequado a localidades distantes e carentes. Esperamos que esse governo e o próximo que venha a exercer a importante função de dirigir a Nação não pretendam preencher essa lacuna com profissionais com formação precária.
Cabe ao governo possibilitar que o médico exerça a sua profissão com segurança e qualidade, oferecendo-lhe condições adequadas à prática diária, oportunidade de reciclagem científica, além de salário digno e, sobretudo, respeito.
Infelizmente, ao contrário das palavras proferidas pelo presidente Lula, não é fácil ser médico nem na Avenida Paulista nem em regiões inóspitas. Isso porque o poder público tem sido omisso e muitas das autoridades constituídas possuem visão distorcida e curta, ou melhor, interpretam os fatos da melhor forma que lhes convém. Pagam o ônus por isso os profissionais de medicina e, sobretudo, os cidadãos, que, lamentavelmente, não recebem por parte do Estado o acesso à saúde, direito fundamental garantido constitucionalmente.
Lamentavelmente, apenas uma pequena parte da população tem acesso aos "médicos da Avenida Paulista", região, sem dúvida, que congrega vários centros de excelência na área da saúde. E os médicos que lá exercem a sua profissão o fazem com dignidade e seriedade, com conhecimento e experiência acumulada, por meio de uma formação mantida de forma contínua. Isso, não tenham dúvida, não é fácil.
A pneumologia entre outras diversas especialidades passa por um momento crítico, em que temos poucos profissionais procurando pela especialidade, principalmente em razão da baixa expectativa de exercê-la de modo digno. Os serviços públicos remuneram mal e muitas vezes não oferecem condições adequadas de trabalho.
A maioria dos pneumologistas do Estado de São Paulo participa dos programas de educação médica continuada oferecidos pelas Universidades e Sociedades Médicas. Isto demanda tempo e dinheiro.
O setor de saúde suplementar (convênios médicos), sem uma política do governo em relação à remuneração dos honorários médicos, paga em média R$ 20,00 a R$ 30,00 por consulta. Descontados os impostos e custos para manutenção de um consultório médico, ao final restam ao profissional de R$ 10,00 a R$ 15,00 por consulta. Será esse o valor da saúde e da vida de um ser humano?
Assistimos, hoje, profissionais brilhantes a desistir de assistir ao paciente, principal papel de um médico: profissionais que levaram seis anos para completar o ensino superior, pelo menos mais quatro para alcançar conhecimento mínimo para exercer uma especialidade e alguns ainda se enveredam pela pós-graduação, com o sonho de pesquisar e ensinar.
Centenas de milhões de pessoas sofrem de doenças respiratórias no mundo, sendo importante causa de mortalidade. Uma criança no mundo, com menos de 5 anos, morre a cada 15 segundos por pneumonia. Mais de 250 mil mortes/ano, entre pacientes com asma, são atribuídas ao seu tratamento inadequado. Estes números são mais alarmantes nos países subdesenvolvidos.
Com a atual política do governo de saúde e educação, a SPPT alerta: em breve não teremos mais pneumologistas, nem na Avenida Paulista.
São Paulo, 20 de abril de 2010
Jaquelina Sonoe Ota Arakaki
Presidente da SPPT
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