domingo, setembro 18, 2011

A Sopa 11/03

Perspectiva.

Vez por outra, é preciso parar, se afastar de tudo, e olhar a vida com certo distanciamento, para poder avaliar e reavaliar os caminhos já trilhados e aqueles que estão a nossa frente. Costumo lembrar a música ‘Paisagem Campestre’, do grande Nei Lisboa, que fala “Eu subi pro alto da montanha / Pra ver a planície / Os homens pequeninos / A aldeia de longe, longe, longe...”, e que fala exatamente isso. Claro que a música não é sobre reavaliar a vida. Ele se afasta mais do que tudo para esquecer Rosa. Após meses, uma súbita compreensão o faz voltar ao convívio das gentes, mas ele chega, ora vejam, a tempo de ver o casamento de Rosa com o filho do comerciante mais rico da cidade. Conclui ele, ao final, “Ah, vidinha burra / Nunca mais subi a montanha”...

Não é, evidentemente, esse o enfoque do que quero falar.

Ainda fugindo do assunto principal, e mantendo-me na música, lembro que, no meu primeiro ano de residência médica em clínica, tive uma paciente chamada – justamente – Rosa. Caso complicado, portadora de hipertensão arterial grave de difícil controle, com insuficiência renal devido à pressão alta, ela ficou internada por mais de um mês na enfermaria. Pois não é que passei esse mês inteiro entrando na enfermaria com essa música em mente? Ainda hoje, quando a ouço, lembro da paciente, que perdi de vista e certamente veio a falecer pouco tempo depois...

Mas falava de parar para reavaliar a vida.

Usualmente, nem conseguimos parar um pouco para pensar, presos que estamos nessa loucura que é a vida diária, quanto mais subir uma montanha. Mas, de tempos em tempos, surge uma oportunidade de nos depararmos com quem éramos no passado, olhar como tem sido a vida com aquele distanciamento de que falei, e poder discutir isso com quem te conhece desde o tempo em que as primeiras encruzilhadas apareceram e as primeiras escolhas foram feitas. Quem acompanha essa caminhada desde o início, e quem pode dizer, sem medo, se estás errado ou não. Poucas pessoas no mundo têm essas credenciais, e quando nos reunimos é sempre revelador.

Aconteceu na sexta-feira que passou.

Fomos surpreendidos, o Márcio e eu, por um e-mail na quarta à tarde, avisando que o Radica estava chegando a Porto Alegre naquele mesmo dia. Organizamos nossos horários e nos reunimos para um happy hour na sexta-feira no final do dia. Conversamos, conversamos, conversamos e conversamos, como fazemos há quase vinte e cinco anos. Sobre tudo, como sempre. Determinada hora, depois de uma pizza, o rompante adolescente: vamos para onde agora?

Para a praia, claro.

Dez e meia da noite, estávamos na estrada contando histórias. Por volta da meia-noite, chegamos ao litoral norte, numa noite típica do litoral norte gaúcho no inverno: deserto, vento nordeste inclemente, frio. Impossível descer do carro sem comer areia. Circulamos por ruas desertas, paramos por uns minutos numa praça para um brinde a nós, e pegamos a estrada de volta, contando histórias e falando da vida.

Por que a praia?

Não importava o destino.

A estrada, os amigos. É isso.

Até. 

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