(Crônicas de uma Pandemia – Nonagésimo Oitavo Dia)
Minha bandeira é vermelha.
Por influência da família – avós, tios, e primos, principalmente – me tornei colorado, torcedor do Internacional de Porto Alegre, passando por cima dos meus pais, gremistas, que – de verdade – nunca estiveram muito aí para futebol. Desta forma, a pressão daqueles que se importavam acabou influenciando e sou torcedor. Sócio, até, apesar de já há tempos não frequentar estádios de futebol.
Futebol tem se tornado cada vez mais uma experiência individual. Eu, quieto, em frente à tevê, sozinho. O que provavelmente me torna o pior tipo de torcedor que existe: não “toco flauta” nos outros para que não encham o saco. Não dou essa intimidade a quase ninguém, e tenho uma relação respeitosa com amigos torcedores de outros times.
Mas não é disso que quero falar.
Minha bandeira já foi vermelha.
Jovem estudante, querendo mudar o mundo, acreditei na utopia de um mundo melhor e mais justo apregoada pelo PT no início dos anos 90. Quando do impeachment do presidente Collor de Mello, acompanhei a sessão da Câmara dos Deputados, em que foi aprovado, direto do Largo Glênio Peres, em pleno Centro de Porto Alegre, ao lado da Prefeitura, com uma multidão que comemorou a decisão histórica e que acabou virando um comício da campanha de Tarso Genro para a prefeitura, eleição que ocorreria semanas depois e que ele venceu e que a comemoração foi com um show no auditório Araújo Vianna em que o músico Vitor Ramil disse que “nada melhor que tocar Beatles para celebrar” e tocou Golden Slumbers ao piano. Desde então, sempre penso em ouvir Beatles quando quero celebrar algo. A música que escolhi para tocar na minha formatura, dois anos depois, foi – justamente – dos Beatles, Penny Lane, que tocaram numa versão instrumental como se fosse o Ray Connif, mas essa é outra história... Votei no PT, admito, até a eleição de 2002, quando o meu voto ajudou a eleger o (hoje) condenado Lula presidente.
O mensalão, a partir de 2005, que acompanhei atento do Canadá, foi o momento da revelação: essa minha bandeira não seria mais vermelha. Transitei, no espectro político, da esquerda festiva em direção centro e progressivamente em direção à direita. Cada vez mais acreditando na liberdade individual. Mas isso é outro assunto.
Minha bandeira jamais será vermelha.
Era o canto das pessoas em manifestações a favor do impeachment da ex-presidente Dilma, e depois durante a campanha eleitoral, cantando contra o PT e favor de qualquer um que não fosse das esquerdas. Estive em uma dessas, e esse canto sempre me incomodava, eu enquanto colorado... Mas é verdade. O que o PT e seus aliados representam é algo totalmente contrário ao que eu penso hoje em dia.
A bandeira agora é vermelha.
Para não dizer que não falei de flores.
Porto Alegre entrou ontem, segundo o modelo de distanciamento controlado do governo do Estado, em bandeira vermelha, o que significa alto risco de contaminação. Após três meses de pandemia no Brasil, desde que começaram as medidas de distanciamento, todo aquela conversa de achatar a curva para que o sistema de saúde não colapsasse, todo esse tempo disponível para que houvesse preparação para que isso não acontecesse, e chegamos aqui com a bandeira vermelha. Incompetência administrativa na gestão, em âmbito local e regional, me parece. Como escrevo isso ainda no calor dos acontecimentos, não quero ser definitivo. Não quero ser injusto, apesar de achar que tinha como ser feito diferente.
As medidas agora serão aumentar as restrições, e todos sofreremos com isso, talvez ainda mais do que antes, pois muitos investiram em estrutura para trabalhar com protocolos de saúde e segurança e agora terão que fechar novamente. Difícil.
Mas se tiver que ser assim, que seja. Paciência. Só não devemos esquecer os nomes de quem conduziu o processo para, lá no final, podermos julgar o que foi feito de certo e de errado.
Teremos que passar por mais isso, e passaremos, com certeza.
Força.
Até.
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