Terminaram os relatos da viagem de fevereiro.
A sensação que fica é a do ninho vazio. Sobre o quê falarei a partir de agora? Seria eu um cronista de viagens? Não, eu sei que não sou “apenas” isso. Aliás, volto àquela definição de muito tempo atrás, de que sou um, mas sou muitos, no sentido de interesses múltiplos, de expansão de conhecimento. Se, em um momento da vida eu achei importante definir quem eu era e me sentir único em todos os diferentes ambientes em que vivia, o momento seguinte é continuar sendo uno (não o jogo, não o jogo) e expandir os horizontes.
Timing é tudo na vida.
Mudando de assunto, mas – no fundo – mantendo a linha de raciocínio, tinha como objetivo nos últimos anos voltar a ler algo que não fosse relacionado ao trabalho e que fosse longe das telas (celulares, tablets, computadores). Era um objetivo difícil em tempos de redes sociais e algoritmos que te fazem passar um bom tempo preso ao aparelho.
Tive, quando no pós-operatório da cirurgia da coluna, duas semanas em casa e repouso, a oportunidade de me desligar do trabalho e me dedicar um pouco e leitura. Consegui retomar, lentamente, esse hábito, mas, ainda assim, o tempo de tela aumentou porque o tempo “ocioso” também resultou em aumento do tempo online, entre celular e streaming, me colocando em dia com séries, documentários e filmes que eu há muito queria assistir e faltava oportunidade. A semente estava plantada, contudo.
Após retornar ao trabalho, decidir manter a leitura para reforçar o hábito, afinal a disciplina leva à consistência. E foi muito bom. Tinha atrasada a leitura de uma série de livros que havia ganho de presente dos meus pais há uns dois ou três anos, e parti daí. É a série Millenium, do escritor sueco Stieg Larson, que escreveu os três primeiros livros da série policial e – fatalidade – morreu antes da sua publicação. Esses três primeiros livros foram um tremendo sucesso, e então a editora encomendou a continuação para outro escritor, totalizando seis volumes. Eu havia lido os dois primeiros livros, iniciado o terceiro e – por circunstâncias diversas – havia parado.
Com a ideia de retomada da leitura regular, voltei à série de livros. E foi uma, digamos, loucura. Não conseguia parar de ler, o que foi muito legal, como nos velhos tempos. Em qualquer intervalo que eu tinha, eu estava com o livro em mãos. Acabei o terceiro livro e li os outros três (todos com ao menos trezentas páginas) em menos de dez dias. O que me deixou muito feliz. Era hora de seguir adiante, escolher o próximo livro, manter o hábito, ser consistente. Entre os livros ainda não lidos que mantinha na mesa de cabeceira ao lado da cama, escolhi uma biografia do Dante Alighieri, que havia ganho de presente.
Comecei a ler, e estou lendo. É uma leitura mais difícil, porque não é escrito na forma de um romance, digamos assim, mas baseado em documentos, fontes, citações. Mas é bem interessante. E aí entra a questão do timing.
Atendi, há alguns dias, um paciente que, em meio à consulta, me disse que, além de sua atividade habitual, era escritora. Sem modéstia, disse que também era. Conversamos um tempo e ela me presenteou com três de seus livros que, em meio essa minha nova fase como leitor, ainda não comecei a ler. Ela retornou à consulta na última sexta-feira e – no final da consulta – perguntou se eu lera os seus livros. Respondi que ainda não tivera a chance porque estava lendo, justamente, a biografia de Dante...
Ela deve ter concluído, baseado no que estou lendo agora, que sou um leitor habitual de grandes obras, quando – na verdade – há poucas semanas tudo o que eu lia eram as notícias do dia, Twitter e Instagram, além de passar um enorme tempo olhando vídeos bobos.
Mas estou melhorando, estou melhorando.
Até.
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