Hoje, sexta-feira.
Como normalmente acontece, atendo ambulatório em um dos hospitais universitários de Porto Alegre no período da manhã. A tarde é dedicada ao meu consultório, que fica em outro dos hospitais universitários de Porto Alegre. Muitas vezes, contudo, a tarde de atendimento é desmarcada para reuniões ou mesmo para ajudar no ambulatório do SUS do Centro de Obesidade onde também trabalho, atividade - no caso - não remunerada.
Atendi meus pacientes no consultório e, na metade da tarde, depois do prejuízo de uma paciente que marcou consulta, confirmou presença e não apareceu, deixei o consultório para ir ao Centro de Obesidade porque havia um paciente do SUS para eu atender. De novo, para não deixar dúvidas, de graça, sem ser remunerado por isso. Paciente grave, que lembrou Dickens (e meus alunos sabem por que), pude ajudá-lo. Orientei, fizemos um plano de tratamento, programamos uma nova consulta em cerca de um mês. Me contou que levou três anos preso na burocracia para chegar a começar a avaliação, mas que agora faltava pouco - nossa esperança, afinal é um caso grave - para que pudesse fazer a cirurgia, que melhorará em muito sua vida. Saí duplamente feliz, por ele e por mim, que pude ajudá-lo dentro das limitações impostas (vários dos exames que ele precisava e até já tinha feito não são cobertos pelo SUS).
Mas aí - infelizmente - voltei a ler o que andam escrevendo sobre a questão e a postura dos médicos no Brasil. Como médico e brasileiro, quando falam, falam também de mim.
E desanimei.
Aquele momento em que realizas que a revolta é sem sentido por inútil, que não há nada que eu possa dizer, por mais que eu tente mostrar como são as coisas, nada vai mudar a ideia estabelecida de que, por ser médico, eu faço parte de uma elite que só quer dinheiro e não está nem aí para a população. Que não quero trabalhar num Posto de Saúde ganhando treze mil reais por que acho pouco. Que não vou para o interior ganhando trinta mil (!) porque acho pouco. Eu não tenho solução, talvez a solução seja mesmo a execução em praça pública.
Não adianta explicar que boa parte dos médicos que estavam nas passeatas estavam lá não por salários, afinal nem trabalham no SUS, mas sim por melhores condições, mais investimentos no sistema de saúde, por uma carreira de estado para médicos, com possibilidade de ascensão, que começariam - assim como juízes - em cidades menores e que teriam a possibilidade de - depois de um tempo migrarem para outras regiões de sua escolha, mas que aí seriam substituídos por outros em mesma situação. Não adianta GRITAR que não é a questão de serem cubanos ou portugueses, espanhóis ou canadenses, é o princípio da necessidade de validação de seus diplomas, como acontece em qualquer lugar do mundo. Se mostrarem competência, TODOS serão bem recebidos.
Tudo em vão.
Pessoas inteligentes sendo iludidas e manipuladas por uma cortina de fumaça lançada por um governo que está perdido, e seguindo pesquisas de opinião esquizofrênicas ("Você acha que a saúde melhoraria com mais médicos? Sim? Viu só, faltam médicos no Brasil!). Aliás, eu espero que estejam sendo iludidas, não seja cegueira ideológica ("esses médicos, todos de direita, só querem o lucro, eles deveriam trabalhar de graça, afinal saúde é um direito de todos").
Final de tarde de sexta-feira, desanimado, decidi largar de mão.
Chega. Acabou. Não aguento mais.
Mas aí olho meu e-mail e recebo o convite oficial para compor a mesa - como Professor Homenageado - da formatura da ATM 2013/1 do Curso de Medicina da UNISC. Ainda tenho por que lutar.
Sorrio.
De volta à luta.
Até.
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