(Crônicas de uma Pandemia – Duzentos e Sessenta Dias)
São duzentos e sessenta dias.
De pandemia. Aqui no Sul do Mundo. E estamos num momento pior, em termos epidemiológicos, do que estávamos há dois meses. Se é segunda onda ou não, não importa.
Casos aumentando, muitos pacientes ligando, mandando mensagens, o consultório cheio de pacientes. Aqueles com outras doenças que agora vêm para revisar e uma parcela grande de pacientes que tiveram COVID e vem para serem reavaliados. Por outro lado, um dos temores que todos tínhamos durante o “lockdown”, de que pacientes com doenças graves tivessem suas doenças agravadas ainda mais pela demora em consultar decorrente do medo de sair de casa, vem se confirmando: nas últimas semanas, pelo menos um paciente chega para mim por semana com um câncer de pulmão bem avançado, quando já não há mais chance de cura.
Será que se tivessem consultado antes teriam chance de cura? Impossível dizer, mas - por não terem vindo – e não por culpa deles, mas de quem assustou a todos com o “fica em casa” a qualquer custo, certamente agora não tem mais. Triste, e ninguém será responsabilizado por isso.
Como eu dizia, seguimos com a pandemia, e agora sem os sinais de melhora que tínhamos anteriormente, pelo contrário. Seguimos, então, com as recomendações de distanciamento social, de evitar aglomerações, uso de máscaras, lavagem de mãos e uso de álcool gel enquanto esperamos as vacinas. E seguimos a vida, com cuidados.
Confesso que – lá em março, quando começou por aqui – eu tinha a convicção (que era esperança, agora vejo) de que no final do ano já a teríamos superado. Tudo começaria a melhorar em setembro, e o Natal seria quase como se nunca tivéssemos passado por isso. Agradeceríamos por todos os que houvessem passado, lamentaríamos aqueles que não tivessem resistido, aprenderíamos com os erros cometidos e viraríamos a página.
Dois mil e vinte e um começaria do zero, na medida do possível.
Eu estava enganado.
Ainda vamos seguir por um tempo convivendo com essa situação, e não há nada que possamos fazer diferente das recomendações que já seguimos. Lembrei de novo da imagem de uma corrida insana, que - quando parece que estamos completando - o ponto de chegada fica mais longe. De novo, paciência, não depende de nós.
Continuo, contudo, otimista.
O final nunca esteve tão perto, mesmo que – em meio a essa névoa de desinformação, boatos, teorias da conspiração – não consigamos avistar a linha de chegada, que está em algum lugar lá na frente, mais perto do que ontem e mais longe do que amanhã.
Temos que seguir correndo (ou caminhando, vá lá) e vivendo.
Até.