Tudo isso (3).
Chegamos em Miami terça-feira à tarde, cerca de 16 horas antes do voo que nos levaria até Guarulhos e depois Florianópolis, de onde sairíamos na quinta-feira de manhã em um carro alugado rumo ao sul, rumo à Porto Alegre, que vivia situação de calamidade pública devido às inundações decorrentes de uma série de circunstâncias que – como em um acidente aéreo – ocorreram simultaneamente ou em sequência para que o desastre ocorresse. Chuvas MUITO acima da média, elevações dos rios que desaguam no Guaíba, falta de manutenção dos sistemas de prevenção às enchentes ao longo de muitos anos, falhas nas bombas de drenagem pelas cidades, entre outros.
Nós, a salvo disso, em outro hemisfério, acompanhávamos angustiados os acontecimentos, com a sensação de impotência de quem está longe dos familiares, das pessoas e dos lugares que nos são caros e que estariam sendo afetados. Uma irracional, mas inevitável, culpa.
Retornamos o carro na locadora e voltamos caminhando para o hotel, que ficava realmente ao lado do aeroporto, em Miami. A viagem havia acabado, agora só esperávamos a hora de iniciar a volta. Pedimos uma pizza no quarto mesmo, que comemos com um vinho enquanto arrumávamos nossas coisas e acompanhávamos as notícias pela televisão.
O voo Miami – São Paulo, que saiu às 11h da quarta-feira, estava com muitos lugares vagos, e conseguimos ficar em assentos de saída de emergência. Vou diurno tranquilo. Pousamos em GRU com pouco mais de duas horas de tempo de conexão, que deveria ser tempo suficiente, mas não seria tão simples como esperado.
Primeiro, o desembarque - remoto, maldição! – demorou bem mais tempo do que o previsto. Segundo, as malas nos atrasaram um pouco mais, aumentando a angústia. Antes, ainda, enquanto estávamos embarcados no ônibus que nos levaria até o desembarque, uma senhora de idade indefinida (para mim, para mim), puxou assunto e, quando soube que iríamos para Florianópolis, pediu para ficar junto conosco para “não se perder”. Tudo certo.
Seguimos juntos no desembarque, a esperamos retirar sua bagagem e fomos passar pela alfândega. Nesses trajetos, conversando com a Jacque, ele havia contado que era “terapeuta”, mas não diplomada, que era “sensitiva” e que viajava o mundo para atender pacientes. Eu apenas ouvia a conversa, sem participar. Já com nossas malas, ao passar pelo funcionário da alfândega, fez algum comentário que não ouvi, mas ele na hora pediu para ela passar para a revista de malas e perguntou se estávamos juntos. Ela disse que sim, no que eu disse que NÃO, o que não adiantou, fomos, a Jacque e eu, encaminhados para uma nova fila, para a revista, junto a ela.
A minha preocupação não era a revista, era o tempo, que passava rápido e se aproximava a hora do embarque para Florianópolis. Pior foi que, esperado que nossas malas passassem pelo raio-x, a “terapeuta” comentou que estava trazendo de volta ao Brasil vinte e dois mil dólares (!) e chegou a sugerir que a Jacque carregasse parte desse dinheiro (!!). Claro que não aceitamos...
Foi corrido, mas conseguimos chegar em tempo e embarcar para Florianópolis. Voo tranquilo, chegamos perto da meia-noite em nosso destino. Ainda tentei retirar o carro reservado naquela hora mesmo, mas não foi possível: teria que voltar de manhã ao aeroporto para buscá-lo. De Uber, fomos até o hotel no centro, onde dormimos.
Na manhã seguinte, após o café da manhã, voltei para o aeroporto onde retirei o carro. De volta até o hotel, por volta das 9h30 saímos de Florianópolis rumo ao Rio Grande do Sul. A primeira parada foi em um supermercado para comprar água para levar para casa e para quem precisasse.
Ainda pararíamos, no trajeto de volta, para comprar cobertores, travesseiros e outros itens para doar aos abrigos montados pelo RS. Com a sensação de atraso, começávamos na prática a ajudar pelo menos um pouco quem estava em necessidade. Entramos no RS com o carro carregado de donativos.
Conseguimos chegar em casa no final da quinta-feira, 09/05, dia que era aniversário do meu pai, que nasceu justamente durante a famosa enchente de 1941, e que não viveu – para o bem e para o mal – para ver Porto Alegre novamente embaixo d’água...
Tudo terminado?
Ainda não. Teria que devolver o carro alugado em Gravataí, pois as agências da locadora em Porto Alegre estavam sem funcionar, na manhã seguinte.
Começava outra epopeia.
Até.