domingo, setembro 27, 2020

A Sopa

 (Crônicas de uma Pandemia – Cento e Noventa e Sete Dias)

Confissões.


Por incrível que pareça para você, fiel leitor, nem todo mundo gosta de mim. Não sou uma unanimidade. Sério.

 

Verdade.

 

Entendo seu espanto, contudo. Como alguém pode não gostar de mim, um cara bem-humorado, simpático e modesto?


Falando sério, agora.

 

Acontece que, durante algum tempo, quando era mais novo e achava que precisava provar muita coisa para muita gente, eu realmente quis que todo mundo gostasse de mim. Foi duro descobrir que isso é impossível, por diversas razões. Desde as relacionadas a quem sou e aquilo quero para minha vida, até aquelas relacionadas às circunstâncias da vida e às outras pessoas. Nada é nada anormal que pessoas entrem e saiam de nossas vidas.

É um processo de seleção, isso o que vamos fazendo durante a vida. Encontramos pessoas, as conhecemos, nos conhecemos melhor por interagirmos com elas, nos reconhecemos nelas. Nem todos estão na mesma sintonia que nós, ou não estão no mesmo barco, seja lá o que isso quer dizer.

 

Procuramos aqueles que são parecidos conosco, com quem nos identificamos. E isso é muito mais marcado quando somos bem jovens, quando estamos formando nossa identidade social, digamos assim, que nada mais é que a forma com que o mundo nos vê e com a qual nos apresentamos.

Para reafirmar nossa própria identidade, procuramos aqueles que se identifiquem com quem somos, ou achamos que somos. É a fase das turmas, dos grupos, todos iguais, músicas iguais, roupas iguais. Lembro do All Star preto, que marcou uma fase. Tudo isso é importante e até fundamental para nos tornarmos adultos, para crescermos.

Chega um momento, porém, que aqui aquilo que somos não muda mais, ao menos não em essência. E chega o dia que percebemos que não podemos (e na verdade não queremos) agradar a todos, fazer todos gostarem de nós. Como toda revelação, que pode ser uma epifania ou não, não é tão simples, e por mais que alguém diga que foi tranquilo, nunca é. Tem gente que nunca consegue, e passa a vida se preocupando com o que os outros vão pensar. E tomando atitudes em virtude do que os outros vão pensar.


Muitas vezes, para chamar a atenção – pois precisam disso, de plateia, circo – criam polêmicas, agridem, tentar chocar os outros e, se e quando conseguem, ficam em estado de êxtase com as reações a suas provocações. Como muitos dos que escrevem em redes sociais. Criam polêmicas, acirrados debates, dão respostas agressivas quando, no fundo, são apenas crianças pedindo atenção. Eu não dou corda a esses provocadores. Não dou bola, que escrevam o que quiserem. Se eu não gostar, ou ficar ofendido, não leio mais, e tenho o poder de exclui-los de minhas relações, de bloqueá-los.


Outro problema que é íntimo desse é que tem muita gente que se leva muito a sério. Que se acha mais ou melhor que outros e saí por aí gritando isso. Vale para as redes e para a vida real. Esses, estão destinados ao esquecimento.


Eu não me levo tão a sério assim. Escrevo porque gosto e porque sinto necessidade de fazê-lo. O que escrevo é de minha única responsabilidade, e arco com as consequências do que digo e faço. Não preciso provar nada para ninguém, mas devo confessar que – de vez em quando - não consigo não pensar que ser quem eu sou e estar onde estou é uma forma de vingança contra alguns por aí que – além de não gostarem de mim – ainda tentaram puxa o meu tapete.


E não conseguiram. 


Até.

 

(um texto de quinze anos atrás, extremamente atual...)

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