(Crônicas de uma Pandemia – Décimo Quarto Dia)
Nada será como antes, amanhã.
Claro, nada é nunca como antes. A vida não volta. Heráclito disse, há muito, que nenhum homem entra duas vezes no mesmo rio, pois já não são as mesmas águas, e não é o mesmo homem. Eu não sou o mesmo que ontem, assim como você, estimado leitor, também não é.
Inexorável.
Sairemos diferentes desse turbilhão em que estamos envolvidos no momento. E espero que para melhor, afinal sou um otimista. É uma oportunidade única para repensarmos valores, reavaliarmos prioridades. O que queremos e quem queremos em nossas vidas. De quem devemos ficar próximos (ou mais próximos) e de quem devemos nos afastar.
Evitar as chamadas pessoas tóxicas.
As pessoas que, estando perto delas, sentimos que temos nossas energias sugadas, drenadas. Pessoas negativas, para quem tudo sempre tem problema, nada nunca está bom.
Sei que é virtualmente impossível fugir de todos os negativos (pessoas, pessoas) com quem temos que conviver. Mas o segredo talvez seja trabalhar para que sua influência sobre o nosso estado de espírito seja mínima. Não é fácil, mas deve ser um esforço diário.
Espero que, além disso, saiamos mais simples disso tudo. Que adotemos estilos de vida mais saudáveis, no sentido de dar valor ao básico, às pessoas. Menos ter e mais ser. Gostaria, espero que eu consiga. Um movimento neste sentido eu já vinha fazendo no último ano, como tenho falado vez e outra.
Outra coisa.
Confesso que é muito estranho isso, de a vida estar em suspenso. As pessoas em casa, distância física de pessoas queridas, família e amigos, mesmo que a tecnologia proporcione encontros virtuais. A incerteza de quanto tempo levará para sermos liberados para retomar a vida causa angústia. O que virá, quem será afetado. A falta de certezas, nesse caso extremo, é o que incomoda a maioria das pessoas. E não podemos fazer nada. Como eu disse outro dia, paciência.
Uma noite dessas, logo após a recuperação do celular (vide crônicas anteriores), estava reinstalando o Spotify. Tenho algumas playlists que me são queridas, com músicas que marcaram a minha vida, aquilo que falei de ‘minha própria trilha sonora’. Por alguma razão ou coincidência, tocou “Cheek to Cheek”, com Frank Sinatra.
Heaven, I'm in heaven
And my heart beats so that I can hardly speak
And I seem to find the happiness I seek
When we're out together dancing cheek to cheek
Decidi, então, que teria que montar mais uma playlist. Chamei de ‘Quarentena’, e além das mais ou menos óbvias ‘O Dia em que a Terra Parou’, do Raul Seixas, e “It’s The End of The World As We Know It”, do REM, incluí apenas músicas dos anos quarenta aos anos sessenta, Ella Fitzgerald, Glenn Miller, Frank Sinatra, Dean Martin, e outros, o que pode fazer você concluir eu faço parte dos grupos de risco, o que não é verdade.
Mas se é para morrer, que seja ouvindo música boa.
Estou brincando, claro.
Música ruim é que pode matar.
Até.