sexta-feira, fevereiro 07, 2025

Vamos Fazer um Churrasco?

Há alguns anos, uma paciente que eu atendia, em meio à consulta e após um comentário meu, disse que eu tinha o timing para a piada, que eu poderia ser um clown. Exceto pelo fato de me chamar educadamente de palhaço, confesso que gostei.

 

Eu sou, sim, meio clown, palhaço se preferirem, no sentido de ‘o tipo de que faz rir’, umas de suas definições. Tenho esse hábito, o de (tentar) fazer humor em diferentes situações, como reuniões, em que esse impulso, o de fazer comentários “engraçadinhos” em meio a assuntos sérios, é quase incontrolável. Porque acho que essas intervenções tornam o ambiente mais leve, sem perder completamente o foco do que está sendo discutido, por exemplo.

 

Quando eu era professor, minhas aulas teóricas sempre iniciavam como se eu estivesse fazendo um daqueles monólogos de abertura de talk-shows, quase um número de stand up comedy, porque acreditava que era contando uma história que eu conquistaria a atenção dos alunos. Até acho que funcionava. Eu, ao menos, me divertia...

 

Além desse lado (que muitos podem discordar que seja adequado ou realmente) bem-humorado, sou declarada e orgulhosamente implicante, assim como meu pai.

 

Meu pai também tinha implicâncias, que eram bem conhecidas de todos que conviviam com ele, e algumas delas não para o lado do bom humor, devo dizer. E manias também, além de alguns bordões, frases clássicas dele, ditas repetidas vezes, e que ainda hoje me vejo utilizando. Como ‘estás trocando o dia pela noite, é hora de revisar teus conceitos...’, que dizia quando meu irmão ou eu dormíamos até muito tarde após ficar acordado até de madrugada. ‘É fácil comandar homens livres, basta mostrar-lhes o caminho do dever’ era outra delas.

 

Entre suas manias, ele não gostava que colocássemos toda a louça a ser lavada dentro da pia ao mesmo tempo, pois o peso excessivo poderia fazer a cuba cair. E, durante muitos anos, toda vez que terminávamos uma refeição na casa dos meus pais, na hora de recolher os pratos e levar para a cozinha, todas as vezes eu dizia para colocar tudo na pia e encher de água. E ele resmungava que não. E eu fazia de novo na próxima vez, e de novo, e sempre, até que ele não falava mais nada, apenas balançava a cabeça.

 

Até hoje ainda falo, mesmo que ele não esteja mais aqui há quase três anos. É quase uma forma de homenagem... E lembro do meu irmão.

 

O meu irmão, hoje em dia americano, já mora nos Estados Unidos há mais de vinte anos, e vem ao Brasil duas ou três vezes ao ano para nos visitar. Ao longo do tempo, e talvez já fosse assim antes, diz ele que perdeu o gosto por churrasco (heresia!). Curte comer carne, mais do jeito americano de prepará-la.

 

Então, TODA vez que ele está para vir, eu digo a ele que estamos preparando um grande churrasco para recebê-lo. Que resmunga dizendo que não. E eu volto, na próxima vez, a falar do churrasco. E de novo. E outra vez.

 

O churrasco virou a louça na pia cheia de água.

 

Sou chato, sim, com orgulho.

 

Até.