Eu vi o outro lado.
Quanto, há 35 anos completos em agosto, eu estava internado em uma UTI em coma, mesmo “fora do ar” eu tinha – de alguma forma – uma noção de que eu estava em um leito de hospital, mas o que eu “via” era uma cama de hospital em frente a uma grande janela, como uma vitrine, que dava vista para um campo, como uma coxilha (uma colina suave em áreas de campo, que pode ter pequena ou grande elevação, geralmente coberta por pastagem). Havia o verde, e o sol forte, como uma luz.
Não, não pensei em caminhar em direção à luz.
Algum tempo depois, não muito, enquanto atendia um paciente ainda como aluno de segundo ou terceiro ano de medicina, ele relatou a sua experiência de quase morte, e falou de um campo e uma luz. Na hora, associei ao que eu tinha visto enquanto em coma, o que me deixou bem impressionado.
Certamente o que aconteceu é que ajustei a minha “visão” ao relato dele, um viés de confirmação. Certamente, percebi logo, o que ele tinha “visto” não era o que eu havia visto, ou sonhado, vai saber. Eu havia criado uma conexão, um tipo de sintonia (que só eu sabia, obviamente).
Trinta e cinco anos depois, ontem, atendo um paciente no consultório. Era o aquele paciente! Não. Não era, nada a ver. Era um paciente que vinha para uma revisão, estava bem, iria fazer alguns exames.
Enquanto conversávamos, ele comentou.
“Estou com cinquenta anos e estou na melhor fase da minha vida. Sou casado e com dois filhos lindos, já sei que nunca vou ganhar rios de dinheiro, mas vivo muito bem, tenho um lugar bom para morar, tenho amigos, faço exercícios, viajo de vez em quando”.
Como há trinta e cinco anos, me identifiquei com ele.
Eu também, eu também.
Até.