sábado, agosto 20, 2005

Diários de uma vida canadense (2)

A chegada.

Aterrisamos (o avião, comigo nele) em Toronto pouco depois das 6:00am. Um dia plúmbeo, com cara de poucos amigos. A passagem pela alfândega e pela imigração foi tranquila, os funcionários todos muito atenciosos e educados. O que demorou foram as malas. Por um problema qualquer, sua chegada ao terminou atrasou uns quarenta minutos, aproximadamente. Mas chegaram inteiras as duas imensas malas que eu trouxe para esta longa estada.

Saindo do aeroporto, peguei um táxi para ir até o hostel onde vou ficar a primeira semana: New College Residence da U of T. No trajeto, vim conversando com o motorista indiano. Ele me contou que deixou a Índia em busca de qualidade de vida para si e para seus filhos (que vão ter mais oportunidades aqui do que em sua terra natal).

Apesar de estar com a estadia reservada, só poderia (em tese) fazer o check in às 2 pm (eram pouco mais de 8 am). De qualquer forma, fui direto à recepção para perguntar se poderia ao menos deixar as malas numa sala qualquer até a hora do checkin. O recepcionista perguntou o meu nome, “Rodrigues”, e, após ele procurar por alguns instantes, achei melhor explicar que o ‘Rodrigues’ era com ‘s’ e não ‘z’. Foi aí que ele encontrou minha reserva.

Perguntou se eu era brasileiro, “Yes”, e de onde. Quando ouviu que eu era de Porto Alegre, perguntou em português com sotaque “De onde?”. Respondi que morava na Independência e perguntei por quê. Me esclareceu que brasileiros tinham estado ali nesse verão e que sua namorada era de Porto Alegre. Por isso, ser de Porto Alegre, eu receberia tratamento especial, e poderia entrar no quarto aqueala hora. Entregou-me a chave (na verdade um cartão para acessar o quarto e uma chave que abre as portas de acesso, que ficam fechadas após as 10pm, e servem também para acionar o elevador), agradeci e subi para largar as coisas.

Como o New College é um dormitório estudantil que durante o verão vira hostel, eu já imaginava o que encontraria: um quarto com uma cama, uma armário, uma poltrona e uma escrivaninha com cadeira. Se eu tivesse televisão e/ou computador, poderia ter tv a cabo e internet no quarto. O banheiro é coletivo, mas com cabines com chuveiro, não sendo aquele lance de vestiário de clube. Cada andar (com muitos quartos) tem uma sala de TV coletiva e uma lavanderia, com máquinas de lavar, secar e uma tábua de passar roupa. Após deixar as malas no quarto e esvaziar parte da mochila, saí para conhecer a cidade e ir encontrar o meu contato aqui, Dr Noé Zamel, um gaúcho que está aqui há mais de trinta anos e que foi quem intermediou minha vinda para cá.

Enquanto caminhava e fazia um reconhecimento do local, lembrei que havia deixado o papel com os números de telefone de lá no hostel, mas lembrei também que eu ouvira falar que ele trabalhava no Mont Sinai. Fui para lá e, chegando, me perguntei como encontrá-lo naquele imenso hospital. Óbvio, fui à central de informações. Chegando lá, perguntei pelo “Dr Zamel, Noé”. “Who?!”. “Dr Noé Zamel”. “I’ve never heard this name…”, mas me ofereceu um telefone para tentar localizado com auxílio da telefonista. Liguei, funcionou e, em pouco tempo, encontrei-o, que me recebeu como um velho amigo que chegara. Disse estar feliz que finalmente eu chegara, que eu ia gostar muito e falou que ia me apresentar a Carlos Gutierrez, a pessoa que seria o meu cicerone neste início, me auxiliando com todas as burocracias e dando todas as dicas que eu precisasse.

Tentou falar com ele, mas descobriu que ele não estava só viria na segunda-feira. De qualquer forma, fomos dalia até o Toronto General, me mostrou onde fica o laboratório e fomos conversando de volta. Falamos sobre o meu fellow, o PEAP (período de avaliação antes de começar efetivamente), sobre o TSE (talvez não precise fazer) e sobre a vida em Toronto em geral. Tudo bem, tudo legal.

Mas eram 10 am de sexta-feira e meu próximo compromisso seria só na segunda-feria de manhã. Tinha todo o final de semana sem poder adiantar nada (apartamento, etc) e sozinho. Neste instante, definitivamente, caiu a ficha. Estava sozinho e – pior – só veria a Jacque de novo em quase quatro meses!

Decidi sair a andar pela cidade. Lenta e calmamente, sem pressa, apreciando o ambiente ao meu redor, segui caminhando em direção ao lago. No trajeto, fui até a CN Tower, 553m de altura, a mais alta estrutura sem sustenção do mundo. Ao lado dela, fica o Skydome, p primeiro estádio do mundo a ter o teto retrátil, e que é o lar do Toronto Blue Jays, time de beisebol local. Dali, segui até o Harbourfront, a região do porto, que foi recuperada e é um ótimo lugar para passear, com parques, cafés e restaurantes. Já eram 11h, a hora em que eu tinha combinado de ligar para a Jacque. Não deu para segurar, e transmiti a ela toda a sensação de vazio e solidão que eu sentia e, claramente, a deixei preocupada.

Resolvi voltar ao hostel caminhando, pela Spadina, desde o porto. Foi uma longa caminhada, passando inclusive pela Chinatown, que fica na própria Spadina, entre outras, até chegar ao hostel. Cheguei cansado, afinal tudo isso acontecera depois do vôo desde Porto Alegre e dormira pouco. Deitei, dormi e, quando acordei, ainda era 15h30. O tempo parecia não passar, para minha aflição. Com o cartão telefônico que eu havia comprado para falar com a Jacque – não consegui, liguei com meu cartão de crédito – liguei para o Neni, meu irmão – que mora aqui perto, em New York.

Conversando por mais de uma hora, ele fazendo o papel de CVV, falando que passara por isso quando se mudara para NY, que era assim mesmo, que ia passar. Eu dizia que sabia que seria assim, mas não imaginava a intensidade. Me aconselhou a usar o final de semana todo que eu tinha pela frente para conhecer a cidade, ser “turistão”. Afinal de contas eu estava em Toronto, a cidade mais cosmopolita do mundo. Melhorei com a conversa.

Saí novamente, dessa vez em busca de uma internet para acessar, ver emails e notícias de casa. Saí para o norte, até a Bloor, e segui para oeste, me afastando da universidade. Na própria Bloor st encontrei um, onde vi meus emails, postei uma mensagem meio triste no blog, entrei no orkut, comunidade ‘Brasileiros em Toronto’ e descobri que nas sextas-feiras havia reunião de brasileiros no Centro Brasil Angola, e estava começando em poucos minutos. Decidi ir até lá. Longa caminhada, e cheguei.

Assisti a uma palestra sobre imigração (que não tinha nenhuma . utilidade para mim), e depois voltei caminhando. No caminho, liguei para o pai e a mãe, que também me deram força para agüentar esse período inicial.

É bom ter referências…

Voltei até o hostel pensando que vai ser difícil esse começo, mas tudo vai dar certo. “O que não me mata me deixa mais forte”, como disse o Neni.


Até.

2 comentários:

Anônimo disse...

Caraca,

Eu imagino o desespero inicial. Eu vim pra ca com o Michael me esperando, aquela ansiedade de nos encontrarmos novamente depois de tanto tempo, aquela felicidade.

Mas me lembro que em uma tarde tambem caiu a ficha, e eu fiquei deprimiderrima de saudade dos meus pais.

But we're hanging in there pretty well, don't you think?

Anônimo disse...

Parabéns pelo post e pela coragem, Marcelo. É bom saber que hoje a sua tristeza passou, e que, de um modo ou de outro, você está em casa.